Foi ao entardecer de um sábado seco em Brasília que os primeiros passos começaram a ecoar pela grama que margeava o Lago Paranoá. De longe, já se ouvia o ronco dos instrumentos sendo afinados na concha acústica. Não era apenas mais um evento cultural na cidade. Era o começo de uma história.

Ali, sob o céu aberto, nasceu o Porão do Rock. Um festival sonhado por bandas que ensaiavam num espaço pequeno e barulhento no subsolo da 207 Norte. No porão, os planos. No palco, a explosão.

O público chegava de todos os cantos da capital. Mochilas nas costas, camisetas de banda, olhos curiosos e um ar de “isso vai ser grande”. E foi. O que se viu naquela noite foi um desfile sonoro de catorze bandas brasilienses que transformaram a concha num campo elétrico de expressão e liberdade.

Maskavo Roots, com sua presença que já indicava voos altos. Pravda, Plástika, Cachorro Cego, Engels Espíritos Band, Auravil, Nulimit, Mata Hari, Zamaster, BsB Disco Club, James Band, Rodeo Drive (que depois ganharia novo nome: Joe Renato Trio), Bigroove e Ponto G. E mesmo ausente dos palcos, a Rumbora também deixou sua marca. Uma de suas músicas estava presente na coletânea oficial do festival, como uma batida a mais no coração do evento.

E que estrutura. Um esquema de som robusto, luzes que cortavam a noite como raios de energia e uma equipe de roadies que parecia operar uma coreografia secreta nos bastidores, garantindo que tudo fluísse com pontualidade e precisão.

Mas o Porão era mais que música. Era um mergulho em cultura alternativa. Ao redor, lanchonetes e bares dividiam espaço com uma feira de fanzines, CDs e fitas-demo. Tinha até bungee jumping pra quem quisesse sentir o impacto do festival no corpo inteiro.

As rádios Cultura FM e Transamérica estavam lá, sintonizadas com a vibração do momento. Até a MTV olhava com atenção. Algo diferente estava acontecendo.

A noite também foi de surpresas. Teve intervenção poética, com o dogboy Gerson de Veras e Solimar Lacerda, misturando palavra, som e presença em uma performance inesperada.

Plástika, já respeitada na cena, brilhou como um dos pilares do line-up. Maskavo Roots fechava acordos com gravadora grande. E algumas bandas ainda ousaram tocar versões de Fernanda Abreu, B52, Bob Dylan, Hendrix, Police e Titãs, conectando o novo com o conhecido, fazendo pontes no tempo.

À medida que a madrugada se aproximava, o chão vibrava, o público dançava, e Brasília ganhava um novo marco na sua geografia cultural.

A primeira edição do Porão do Rock não foi apenas um show. Foi um rito de passagem.

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